Ontem nove do nove de dois mil e doze o dia 85 de joaquim pessoa

A minha mãe continua saudável. Já faleceu, mas continua saudável. O amor é feroz, comovente, permanentemente provocador. E, dele, sentimos tanto a falta quanto a falta das nossas mães. Elas são as trabalhadoras da coragem. E da mais profunda dignidade. São as grandes personagens femininas que merecem o óscar do filme das nossas vidas. E apesar de serem sempre nomeadas, raramente chegam a receber o troféu.
Vivemos um dia de cada vez. E quando já não temos mãe, vivemos sem mãe um dia de cada vez, o que é dolorosamente pior. Quem nunca conheceu a mãe, não chegará nunca a conhecer-se. E também nunca será reconhecido pela vida porque a ligação que temos com ela é feita através do cordão umbilical. Que nunca chegamos a cortar. Esse acto físico não é mais do que uma ilusão. É por isso que um pai nunca será uma mãe. Pode ser como uma mãe, mas não será a mãe. Nem com esforço. Nem com dedicação. nem com convicção. Nem com amor. Foi isso que a minha mãe me ensinou sem nunca me ter dito nada. E é por essa razão que quero agradecer à minha mãe a possibilidade que me deu por escrever, hoje, este texto.

Joaquim Pessoa,In Ano Comum