lírio e tulipa em chão escarlate

Porque me guardais este fado?
Dizei-me senhor meu amado

Assim vos jurarei que em outubro,
pintarei toda esta vista, de chão de fogo rubro,
de lírios brancos e tulipas, dum raro veludo negro
de caixilho encontrarei, cortina de denso cedro

Assim vos digo, e assim farei, assim vai acontecer.
Acreditai podeis crer podereis mesmo conhecer
Pois em outubro assim vai ser, se te decidir pertencer

Verde pino quão ditoso, porque me separais o olhar,
serrais fileiras inteiras e me forçais a aqui estar?

Sombras negras de vestes brancas e braços erguidos aos céus
serão anúncios de meu fado, lembrarão um sonho meu
Corpos de plumas-de-seda, envoltos em finos véus
testemunhos do destino que o céu me concedeu

Pois um novo arco-íris, de um país inventado
surgirá no horizonte assim mesmo emoldurado
paleta de duas cores em direcção ao firmamento
farão as vozes dos céus, do novo conhecimento

Lírio e tulipa se erguerão acima do chão escarlate
mostrarão sua grandeza de gema de grã quilate


um futuro em notas soltas

recolho os despojos de pedaços de mim
dispo resoluta o peso da cota de malha
da dor e pena profunda de longa e dura batalha
escolho e dito as tréguas e declaro o fim

Já refeita e bem ciente lembro a intenção
e com flores frescas acabadinhas de colher
que a mãe natureza fez questão de me oferecer
bordo a nova pele em toda a sua extensão

E ensaio agora o futuro em notas soltas
que se esgueiram livremente de dentro do meu peito
e quase sem querer eu ganho o jeito
trauteio acompanho e apanho-lhe as voltas

Tomo os campos num longo e terno abraço
abro o sol e risco alegre o espaço

pinto a festa e arrisco lançar o laço
retoco um aro-íris no meu regaço
derramo e esbanjo a luz na areia branca
aconchego com ternura o verde mar
abro as asas leves e decido voar

no mapa do teu corpo

no mapa do teu corpo procuro o olimpo
num espaço apagado de tempos de dor
e de olhos fechados invento o amor

recorto enseadas, baías, regatos e moldo a paisagem
planto caminhos, ergo cascatas, desenho a viagem
e resgato qual Héstia, meu fogo sagrado em águas profundas,
invento-me Réia e me ensino o caminho de terras fecundas.

no mapa do desejo, escuto Eros e me aprendo de novo
na terra quente experimento, guardo, aprendo e renovo
e me vejo inteira e abro meus olhos,
recolho minh'alma de debaixo de escolhos

traço a traço
lego a Ares os meus passos calcados
colados às marcas de passos passados
onde rainha dum paço 
em que posso sem medo dizer
vivi soberana num palco a que quis pertencer
sem fados, sem fardos, sem sombras, rasuras,
repleto de luz vinda de mim, escapando clausuras
feita fortuna, feitiço, loucura, vitória, saber
e volto a (a)riscar o caminho de volta
na pele do meu manto de terra que sempre quis ter